Isenção de Imposto de renda: cardiopatia grave

No primeiro quadrimestre do ano o contribuinte pessoa física que ultrapassa a renda prevista como isenta pela legislação tributária deve apresentar à Receita Federal a sua Declaração Anual de Imposto de Renda (DIRPF), o que muitas vezes pode causar espanto devido às quantias expressivas pagas ao fisco ou dificuldades financeiras de arcar com o tributo devido como saldo de imposto a pagar, principalmente aos aposentadas, pensionistas ou reformados que sofrem com enfermidades e têm que arcar com os custos dos tratamentos.

Diante disto, visando facilitar a manutenção da vida dos aposentados, reformados ou pensionistas, existe previsão na Lei 7.713/1988 de que são isentos do pagamento do Imposto de Renda os proventos de aposentadoria, reforma ou pensão em caso de ser o contribuinte portador diversas moléstias previstas na lei supracitada.

No caso, vamos nos ater a detalhar a isenção concedida para portadores de cardiopatia grave. O Art.  XIV da Lei 7.713/1988 determina que os portadores de cardiopatia grave são isentos da incidência do Imposto de Renda. Entretanto, o termo cardiopatia grave é uma designação que pode ser usada para várias doenças que afetam o coração e não se refere a uma enfermidade específica.

Igualmente, a legislação não define quais são as doenças cardíacas classificadas como graves para que se obtenha a isenção e, por isso, a análise dos documentos médicos e do histórico clínico do contribuinte são fundamentais para que seja corretamente avaliado se existe o direito à isenção ou não. Mais precisamente porque a classificação de uma cardiopatia como grave depende de critérios médicos e periciais de avaliação complexos.

Por exemplo, são cardiopatias que podem ser consideradas graves: cardiopatia isquêmica, cardiopatia hipertensiva, miocardiopatia, valvopatia, estenose mitral, insuficiência aórtica, estenose aórtica, prolapso valvar mitral, cardiopatias congênitas, arritmias cardíacas, disfunção do nó sinusal sintomática, bradiarritmias, taquiarritmias cor pulmonale crônico.

Mais precisamente, a Diretriz Brasileira de Cardiopatia Grave considera como cardiopatia grave:

a) cardiopatias agudas, habitualmente rápidas em sua evolução, que se tornam crônicas, caracterizadas por perda da capacidade física e funcional do coração;

b) as cardiopatias crônicas, quando limitam progressivamente a capacidade física e funcional do coração (ultrapassando os limites de eficiência dos mecanismos de compensação), apesar do tratamento clínico e/ou cirúrgico adequado;

c) cardiopatias crônicas ou agudas que apresentam dependência total de suporte inotrópico farmacológico (como dobutamina, dopamina) ou mecânico (tipo Biopump, balão intraaórtico);

d) cardiopatia terminal: forma de cardiopatia grave em que a expectativa de vida se encontra extremamente reduzida, geralmente não responsiva à terapia farmacológica máxima ou ao suporte hemodinâmico externo. Esses pacientes não são candidatos à terapia cirúrgica para correção do distúrbio de base (valvopatia, cardiopatia isquêmica, cardiopatia congênita…), ou ao transplante cardíaco, devido à severidade do quadro clínico ou a comorbidades associadas (hipertensão arterial pulmonar, disfunção renal severa, neoplasia avançada).

Ocorre que em um grande número de pacientes, cirurgias ou procedimentos intervencionista alteram efetivamente a história natural da doença para melhor, modificando radicalmente a evolução de muitas cardiopatias e, consequentemente, a categoria da gravidade da cardiopatia, pelo menos no momento da avaliação médico-pericial e, como isso, pode-se pensar que a isenção não é devida.

Todavia, em que pese nas perícias realizadas perante os órgãos governamentais se exija a contemporaneidade dos sintomas da cardiopatia grave, ou seja, que no momento do exame pericial o contribuinte apresente disfunções cardíacas severas, no âmbito do Poder Judiciário há maior flexibilização, pois entende-se que a isenção aos portadores de doenças descritas na Lei 7.713/1988 tem a finalidade de facilitar que o enfermo custeie os tratamentos médicos e farmacológicos necessários ao controle da doença, ainda que não apresente gravidade no momento em que requerida a isenção.

Além do mais, a diretriz de cardiopatia grave ressalta que “[…] Essencialmente, a classificação de uma cardiopatia grave não é baseada em dados que caracterizam uma entidade clínica, e, sim, nos aspectos de gravidade das cardiopatias, colocados em perspectiva com a capacidade de o servidor exercer as funções laborativas e na relação desses aspectos com o prognóstico de longo prazo e com a sobrevivência do indivíduo.” Quer dizer, deve-se analisar a situação concreta do passado e do futuro do contribuinte que busca a isenção para se aferir a gravidade da cardiopatia.

Inclusive, a questão da presença de sintomas foi sumulada pelo STJ no ano de 2018 no enunciado nº 627, no qual se assentou que não é exigido do contribuinte a contemporaneidade dos sintomas para a manutenção ou concessão de isenção de Imposto de Renda requerida no âmbito do Poder Judiciário.

Aliás, em decisão recente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, de nº 5042086-64.2015.4.04.7100, foi concedida a isenção a aposentado que fora acometido por cardiopatia grave e teve a sua situação estabilizada, visto que se entendeu que “[…] A estabilização da doença, alcançada pela cirurgia para o implante de stents, marcapasso e a utilização de medicamentos de uso contínuo, não afasta o caráter grave da cardiopatia, nem mesmo o direito à isenção pretendida”.

Assim, sem dispensa de análise minuciosa da documentação médica, reconhece-se o direito à isenção à portadores de doenças cardiológicas que em algum momento tenham apresentado quadro de gravidade, mesmo que os sintomas estejam controlados, seja pelo uso de medicamentos, pela realização de procedimento cirúrgico de implante de stent, marcapasso, próteses valvulares, revascularização do miocárdio, etc.